Com a entrada em vigor da Lei n.° 83/2021, de 6 de dezembro, a qual modificou o regime de teletrabalho e alterou, consequentemente, o Código do Trabalho, passou a estar legalmente estabelecido que o trabalhador deverá ser integralmente compensado pelo empregador de todas as despesas adicionais que comprovadamente venha a suportar como consequência direta do teletrabalho. Como proceder e enquadrar o pagamento de tais despesas é que poderá ser um problema.
No passado mês de janeiro entrou em vigor a Lei n.° 83/2021, de 6 de dezembro, a qual modificou o regime de teletrabalho e alterou, consequentemente, o Código do Trabalho.
Passou o mencionado diploma legal a estipular que o trabalhador deverá ser integralmente compensado pelo empregador de todas as despesas adicionais que comprovadamente venha a suportar como consequência direta do teletrabalho, nelas se incluindo as despesas adicionais com custos de energia e de rede instalada em condições de velocidade compatível com as necessidades de comunicação de serviço, assim como os custos de aquisição e manutenção de equipamentos e de sistemas informáticos.
Esclarece o legislador que são despesas adicionais as correspondentes a aquisição de bens e ou serviços que o trabalhador necessitou imperialmente de realizar e dos quais não dispunha antes do regime de teletrabalho a que ficou, entretanto, sujeito, ficando as mesmas determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no mesmo mês do último ano anterior.
De realçar ainda que de acordo com a nova legislação, esta compensação, em termos de efeitos fiscais, deverá ser considerada um custo para o empregador e não constitui um rendimento para o trabalhador.
Ora, salvo melhor e douta opinião, aquilo que poderia parecer uma norma esclarecedora e justa tanto para o empregador como para o trabalhador, pode, no fundo, tratar-se de uma verdadeira dor de cabeça para ambos.
Senão vejamos:
Imaginemos o caso de dois trabalhadores que exercem a sua atividade para entidades empregadoras diferentes e que se encontram em regime de teletrabalho na mesma casa.
1) Como comprovam, cada um destes trabalhadores, as despesas adicionais que cada um teve a partir do momento em que iniciou o regime de Teletrabalho?
2) E as empresas, entidades empregadoras, como calcularão, cada uma delas, o acréscimo de custos que têm de suportar com cada um dos seus trabalhadores?
A legislação e as alterações ora introduzidas ao Código do Trabalho nesta matéria, não resolvem situações como as supra referenciadas, podendo mesmo levar a que muitos trabalhadores, em face da dificuldade de prova, desistam de solicitar à sua entidade empregadora o pagamento da compensação em questão.
Não menos frequente poderá ser o cenário em que as despesas adicionais que os trabalhadores apresentam à sua empresa, sejam sustentadas numa fatura de eletricidade ou de rede de internet que não esteja em seu nome.
Nestes casos, como conseguirá o trabalhador comprovar que é efetivamente uma despesa sua?
E a empresa, como poderá enquadrar a empresa o pagamento da compensação paga ao trabalhador se a fatura apresentada pelo trabalhador, não está, naturalmente, emitida em nome da empresa?
Que tratamento fiscal terá este pagamento de compensação?
Mais uma vez a legislação atual não soluciona.
Muitas empresas, tendo em vista agilizar toda esta situação, têm manifestado a intenção de vir a optar por fixar um valor mensal a pagar ao trabalhador, para compensar as despesas que o mesmo acarretou, e acarretará, enquanto sujeito ao regime de teletrabalho.
Ainda assim, sempre se colocará a questão de como calcular justamente o montante máximo e o montante mínimo a fixar para esta compensação. Mais. Podemos questionar, em face da legislação existente, se existem ou não limites às empresas para a negociação do referido montante e se será ou não possível às empresas decidir unilateralmente pelos montantes a fixar para a compensação?
Por outro lado, se é verdade que com esta medida o trabalhador poderá deixar de ter que comprovar a sua despesa adicional, não menos verdade é que a empresa continuará sem saber como enquadrar fiscalmente o pagamento, neste caso, regular, desta compensação, na medida em que legalmente a mesma não pode, por um lado, ser considerada retribuição do trabalhador e, por outro lado, deverá ser considerada um custo para a empresa.
Contudo e apesar de todas as questões suscitadas, até que o Governo se proponha a esclarecê-las, entendemos que o melhor caminho para as empresas e até para o trabalhador - que desta forma não necessita de fazer prova das despesas adicionais em que incorreu -, deverá ser, exatamente, de considerar o pagamento deste montante como subsídio compensatório.
Na verdade, entendemos que mediante acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador, deverá ser fixado um montante mensal, a ser pago ao trabalhador como forma de compensação pelas despesas acrescidas em que incorre em face do regime de teletrabalho a que passou a estar sujeito.
Estamos cientes que, naturalmente, sendo este pagamento um subsídio de compensação, passará o mesmo a ser considerado retribuição do trabalhador e consequentemente terá incidência ao nível do pagamento à segurança social, bem como incidência fiscal ao nível de IRS e de IRC. Cremos, ainda assim, ser esta a solução mais equitativa e justa para ambas as partes.
Tânia Gonçalves Leal (Advogada/sócia) tgl@lfadv.pt